segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Diário


Na volta de uma recente viagem, esqueci no ônibus o livro que estava lendo -Número Zero, Umberto Eco. Rateadas dessas acontecem com mais frequência do que eu gostaria de admitir. 

Pra evitar esquecimentos, me disciplinei a jamais colocar livros no "bolsão em frente ao assento (o verdadeiro triângulo das Bermudas do transporte rodoviário, onde livros somem para nunca mais)". Nem sempre funciona: na ocasião, o livro deve ter caído das minhas mãos para o colo e de lá para o chão enquanto eu sonhava. Só me dei conta da perda em casa, quando procurei o livro na mochila para aquela lidinha básica antes de dormir. Putz... a alternativa era buscar na estante um substituto, mesmo já tendo lido todos que estão ali.

Quem gosta de ler e lê bastante deve concordar comigo: com tanta coisa boa pela frente, tanta ignorância a aplacar, reler, mesmo os favoritos, não é uma decisão fácil. Dá um pouco a sensação de que deixamos de procurar, de avançar. Por outro lado, um reencontro com um livro que tenha nos marcado está sempre no horizonte dos nossos desejos, né? E no fim das contas, podemos avançar em várias direções, mesmo refazendo o caminho. 

Enfim... mania é mania, não se discute. Gosto de ler antes de dormir e precisava escolher, naquela estante, um livro já lido.

Ainda no corredor, entre o quarto e a sala, me decidi pelo Grande Sertão: Veredas. Mas, enquanto percorria com o olhar as lombadas, me lembrei que, em Itabuna, um mesmo livro (Doutor Fausto) havia pintado em duas conversas diferentes, com uma colega e minha irmã. Muita coincidência. Resolvi dar essa moral pro destino e, pedindo desculpas ao Guimarães Rosa, desviei para o Thomas Mann.

Li Doutor Fausto em 2012. A releitura tem um aspecto novo, interessante e divertido: descobrir o que o tempo fez ao livro e ao leitor.  Já nas primeiras páginas, o prazer cada vez mais raro de um texto denso e profundo. Linda dissonância da norma nesses tempos velozes e fragmentados da www, onde todo mundo escreve se achando juiz e comediante, com incontinência verbal e as postagens já envelhecem enquanto são escritas. 

Como contraponto, já tá valendo.